A fibromialgia é uma doença bastante complexa e as suas causas ainda não são totalmente compreendidas. Alguns sintomas, no entanto, já foram mapeados e são quadros comuns associados à doença: dor no corpo generalizada, fadiga, sensibilidade ao toque, alterações no sono, entre outros. Como é uma doença não tão comum e ainda não adequadamente esclarecida, existem muitas dúvidas em torno da fibromialgia: é doença autoimune? É hereditária? A medicina aponta alguns fatores que criam as condições para o surgimento da doença. Para nos ajudar a entendê-los, entrevistamos o reumatologista Felipe de Lacerda.
Fibromialgia é hereditário, mas a influência genética é complexa e variável
Segundo a explicação do reumatologista Felipe de Lacerda, existe um fator genético relevante na origem da fibromialgia. “Pessoas com parentes de primeiro grau diagnosticados com fibromialgia têm 8 vezes mais chances de serem diagnosticadas com a doença em algum momento da vida, se comparadas a pessoas sem esse histórico familiar”, afirma.
No entanto, ele ressalta que esse fator hereditário é complexo e variável, já que apenas um único gene não é suficiente para desencadear a fibromialgia; é necessária a combinação de vários. Inclusive, pouco se sabe sobre os genes específicos envolvidos na origem da doença, segundo uma publicação do National Institutes of Health (NIH).
Desequilíbrio de neurotransmissores no cérebro está entre as causas da fibromialgia
Além do fator genético, o desequilíbrio de neurotransmissores no cérebro está entre as causas da fibromialgia. A saber, os neurotransmissores são substâncias químicas presentes no cérebro que coordenam as funções do corpo, inclusive os estímulos de dor.
Só para exemplificar, o Dr. Felipe cita que a norepinefrina, serotonina e GABA estão envolvidos em vias que ajudam a diminuir a sensação de dor, enquanto o glutamato e substância P têm funções nas vias que aumentam a sensação dolorosa. Em pessoas que não sofrem com fibromialgia, tende a haver equilíbrio nesses neurotransmissores. Por outro lado, “na fibromialgia, são observadas alterações em níveis de neurotransmissores e/ou no funcionamento das vias que essas substâncias químicas controlam”, segundo o especialista.
Fibromialgia não é doença autoimune, mas existe uma relação entre essas condições
Não é incomum que as pessoas achem que fibromialgia é autoimune. Porém, não é o caso. As doenças autoimunes são causadas por um desequilíbrio entre o sistema imunológico, que ataca tecidos saudáveis do próprio corpo para se defender de estímulos considerados ameaças, como vírus ou bactérias. A fibromialgia, em contrapartida, não é causada por essa desordem no sistema imune.
No entanto, pacientes com condições autoimunes apresentam maior incidência de sintomas de fibromialgia se comparados à população saudável, de acordo com o Dr. Felipe. “Até o momento a explicação para isso não reside em causas autoimunes, e sim em alguns fatores, como: dor crônica, maior tendência ao sedentarismo, maior incidência de depressão e ansiedade, e situações de estresse crônico acompanhadas de angústias, inseguranças e estigmas comuns às doenças autoimunes”, afirma.
Problemas de saúde mental estão relacionados à origem da fibromialgia, e vice-versa
Outro fator que pode contribuir para a origem da fibromialgia, como citamos no tópico anterior, é a presença de problemas de saúde mental, como transtorno de ansiedade e depressão. Conforme aponta um artigo científico publicado na Psychology Research and Behavior Management, trauma e estresse prolongados na infância e na vida adulta afetam negativamente os sistemas moduladores do cérebro, tanto da dor quanto das emoções.
Por isso, traumas psicológicos e ambiente familiar disfuncional, por exemplo, podem estar entre as causas da fibromialgia. Em relação ao segundo fator, o reumatologista aponta que os comportamentos e mecanismos de enfrentamento de situações em uma mesma família podem constituir um ambiente favorável ao desenvolvimento da condição. No entanto, o Dr. Felipe faz a seguinte ressalva: “pode haver um fator mais relevante, porém sempre em pacientes geneticamente predispostos.”
Da mesma forma que os problemas de saúde mental podem predispor à fibromialgia, essa doença costuma potencializar ou ocasionar quadros de ansiedade e depressão. Afinal, os sintomas podem ser bastante limitantes, afetando a qualidade de vida e a funcionalidade do paciente.
Outros quadros de dor crônica podem causar fibromialgia no corpo, a longo prazo
Existe ainda uma correlação entre outras condições que geram dor crônica, como a hérnia de disco, e a fibromialgia. “Pessoas que têm algum quadro doloroso podem sofrer um processo de generalização da dor, se tal processo se estender por muito tempo. Nesses casos, a dor localizada, devido a um dano ao tecido ou a uma raiz nervosa, passa a ser difusa, com a característica da fibromialgia”.
Em síntese, o que causa fibromialgia ainda não está claramente definido, mas a literatura médica aponta alguns fatores que podem influenciar na origem da doença. Entre eles, a carga hereditária, o desequilíbrio de neurotransmissores, os problemas de saúde mental, outros quadros de dor crônica e consequências de doenças autoimunes. Sem dúvida, estamos falando de uma doença bastante desafiadora, mas que tem tratamento e que pode ser gerenciada com o auxílio de medicamentos, psicoterapia e mudanças no estilo de vida.
